Como conduzir conversas difíceis?

Franciane Ulaf

Conduzir conversas difíceis

Uma pergunta pertinente em um ano em que as emoções estiveram acaloradas! Conversar com uma pessoa que está estressada, frustrada, nervosa, mal humorada já é difícil, mas e quando ambos estão sentindo o mesmo? Durante a pandemia muitas famílias, trancadas em casa por longos períodos, se depararam com esse dilema. Como conversar e obter resultados positivos em situações tensas?

Quando os ânimos estão quentes, tentar conversar pode ter efeitos desastrosos. Se você se encontrar em uma situação assim, tente seguir as dicas abaixo para acalmar os ânimos e/ou obter resultados positivos:

1. Não imponha seu ponto de vista

Num mundo cada vez mais polarizado é difícil ver uma conversa em que duas pessoas com pontos de vista opostos respeitam a opinião do outro. Geralmente as partes se intercalam lançando pontos batidos (argumentos que aprendem na mídia social) e abusando de falácias lógicas como o espantalho, exagerando um ponto isolado do argumento para fazê-lo parecer ridículo ou improvável (ex. os evolucionistas dizem que o homem evoluiu do macaco, mas se fosse assim não haveria mais macacos), apelo à emoção fazendo chantagem emocional com a outra pessoa (ex. poxa, olha o tanto que eu me esforço, você não devia me tratar assim).

Em tempos de rivalidades políticas que acabam influenciando opiniões na vida cotidiana, uma falácia comum é a chamada “você também” (tu quoque). Ao invés de responder às críticas do interlocutor, a pessoa vira a conversa: “e você?”; “você também faz isso”. Em discussões políticas é comum as pessoas jamais admitirem discussão dos podres de seu próprio partido. Elas sempre acusam o outro lado de “coisa pior”.

Em discussões em que você está tentando obter resultados positivos, evite cair vítima na tentação de dizer ao outro o que você realmente pensa quando há divergência sérias de opinião.

É comum a ilusão de que ao colocar seu ponto de vista a outra pessoa vai ouvir, entender, e concordar com você. Há momentos para fazer isso. Quando os ânimos estão quentes, o ideal é não tentar doutrinar os outros com suas próprias ideias.

Escute pacientemente o que o outro tem a dizer sem argumentar. O que nos leva ao próximo ponto.

2. Escute mais do que fala e estimule a outra pessoa a falar

Quando as pessoas estão estressadas e frustradas elas querem botar pra fora. Elas querem falar para quem estiver disposto a ouvir sua lista de reclamações do mundo. Às vezes, você pode fazer parte dessa lista de roupa suja e pode ter o impulso de burlar a primeira dica e tentar impor a sua própria opinião ou entrar em uma discussão para provar que você está certo e a outra pessoa errada.

Não faça isso! Qualquer tentativa de se impor será contraprodutiva. A outra pessoa não vai engolir a sua “superioridade” (sim, é isso o que você está tentando fazer quando você tenta contra-argumentar, você tenta mostrar ao outro que é superior, ou “certo” enquanto o outro está “errado”). Quando os ânimos estão quentes, não importa quem está certo. O objetivo deve sempre ser baixar a temperatura (mesmo que você não obtenha o que você quer).

Uma conversa produtiva nem sempre resulta em você obtendo o que você quer. Essa mentalidade (de sempre conseguir o que você quer) é que tende a complicar as coisas. Se você está lidando com uma pessoa “difícil”, aprenda que seus objetivos podem ser alcançados aos poucos, ao longo de muitas conversas. Nessa situação o pior que você pode fazer é querer estar certo e não dar o braço a torcer. Serão então duas pessoas “difíceis” conversando sem que uma tenha a sabedoria de conduzir a conversa com maturidade.

O ideal é deixar a outra pessoa desabafar. Escute bastante, balance a cabeça como se estivesse concordando (mesmo que não concorde!), e mantenha a calma. No livro Comunicação não violenta, Marshall Rosenberg ensina que repetir o argumento da pessoa (como se você estivesse fazendo questão de mostrar que realmente entendeu o que a outra pessoa disse) é a chave para acalmar ânimos e obter resultados positivos em uma conversa difícil. Quem está nervoso ou frustrado busca empatia, não argumentos! Ao prover essa empatia que o outro busca, a pessoa tende a se acalmar e a conversa pode progredir para outro nível.

3. Não dê conselhos não solicitados

Você conhece aquela pessoa que está sempre dizendo o que você deve fazer? Se você conta uma história qualquer, ela já vem dizendo como você deve resolver o problema ou o que você deveria fazer sobre a situação. É muito chato!

Quando as pessoas contam histórias, mesmo que estejam falando sobre problemas que precisam ser solucionados, às vezes elas estão apenas desabafando. Elas podem não estar em busca de conselhos. Quando elas querem a sua opinião elas deixam isso claro perguntando “o que você acha?” ou ainda diretamente “o que você acha que eu devo fazer?” ou “o que você faria no meu lugar?”. Se essas perguntas não aparecem durante a conversa, é provável que a pessoa não esteja realmente a fim de ouvir o que você pensa e só queira mesmo desabafar.

Um ponto importante sobre a comunicação é que as pessoas geralmente não conversam umas com as outras para “trocar ideias”, elas falam porque querem ser ouvidas e pouco se importam com o ponto de vista ou ideias dos outros. A maior evidência desse traço é que em uma conversa a maioria das pessoas mal presta atenção no que o outro está falando, elas já estão pensando no que vão dizer assim que tiverem uma nova oportunidade para falar. Sabe aquela pessoa que sempre tem uma história melhor, mais engraçada, mais terrível, mais catastrófica, mais tudo do que a história que foi contada pelo interlocutor? Exatamente! As pessoas querem contar as suas histórias e elas querem que você as ouça. Egoísmo? Certamente, mas assim é o mundo em que a gente vive. Querer mudar as pessoas, especialmente durante um momento de estresse, é uma má ideia.

4. Não acuse e não culpe

Na mesma linha das dicas anteriores, acalmar os ânimos e mover a conversa para um ponto mais positivo (ou terminá-la gerando bem-estar para as partes) depende da sua paciência para não cutucar a onça com vara curta! Aqui novamente é importante abrir mão de estar certo e priorizar a paz. De todas as opções para escalar uma conversa acalorada para uma discussão exaltada acusar e culpar a outra pessoa está no topo da lista. É a vara mais curta!

A questão aqui é compreender com maturidade que jogar erros na cara do outro, acusar a pessoa de ter feito isso ou aquilo jamais resulta em um desfecho positivo. Não é como se a outra pessoa, já estando estressada e nervosa, vá olhar pra sua cara e dizer “é mesmo, é verdade! Eu fiz tudo isso! Eu sou um idiota mesmo! Me desculpe…”. Não, as chances de que a pessoa fique ainda mais exaltada são muito grandes.

O psicólogo de Harvard Daniel Gilbert diz que a maioria das pessoas prefere estar certa do que ser feliz e essa é a razão da miséria emocional que muitos vivenciam. Isso é verificado em discussões em que um joga “a verdade” na cara do outro e as coisas só ficam piores. O que as partes esperam? Que o outro admita que está errado, coloque o rabo entre as pernas e fique quieto?

Um dos segredos da felicidade é a maturidade e isso envolve abrir mão de estar certo para acomodar a imaturidade dos outros à nossa volta.

5. Mostre interesse genuíno

A culminação de uma comunicação eficaz é adotar uma postura de real interesse pelos outros e seus problemas. Como discutimos, a maioria das pessoas não se importa com o que os outros (você) pensa, a não ser que seja algo sobre elas mesmas. Muitos não pensam nisso explicitamente, mas sentem inconscientemente que vivemos em um mundo de egocêntricos.

Ao fazer o movimento contrário e demonstrar real interesse pelos outros, você oferece algo que esse mundo ardentemente carece: empatia. Pessoas que têm real empatia pelos outros são raras e, por esse motivo, altamente valorizadas. Algumas pessoas já nascem com esse dom, outras precisam desenvolvê-lo.

Desenvolver a empatia envolve aprender a ver o outro como alguém exatamente como você. Quanto mais você sente que a outra pessoa “é como você”, sente como você, tem sonhos como você, tem inseguranças como você, mais você tende a dar valor para o que ela está passando o que ela tem a dizer. De fato, a quebra total da empatia humana ocorre quando a narrativa do “nós contra eles” (muito comum na política atual) vence e começamos a ver os outros como estranhos que não têm nada a ver conosco. É claro que traços de personalidade como narcisismo e psicopatia (muito mais comum do que se imagina!) são completos opostos da empatia, mas em tese, qualquer um que tenha real vontade de se tornar um ser humano melhor, mais maduro e feliz pode procurar ser mais empático. E não há oportunidade melhor para treinar a empatia do que em discussões acaloradas!

Print Friendly, PDF & Email
Compartilhe!
Cadastre-se gratuitamente no Guia da Vida e tenha acesso a nosso melhor material sobre desenvolvimento pessoal, produtividade, saúde mental e motivação:


Deixe um comentário