Será que o fracasso torna a vitória ainda mais saborosa?

Franciane Ulaf

Será que o fracasso torna a vitória ainda mais saborosa

O fracasso dói, baixa a autoestima, nos faz pensar que talvez aquilo não seja pra nós. O fracasso é parente da rejeição. Em muitos casos, a sensação é a mesma. A psicologia humana evoluiu para nos sentirmos mal com o fracasso e bem com a vitória. Dessa forma, conseguimos cognitivamente identificar o que funciona e o que não funciona, qual o melhor caminho a seguir, e assim por diante.

Nossos antepassados se baseavam nessas sensações positivas e negativas para navegarem um mundo novo que o fantástico e estrondoso desenvolvimento do cérebro humano estava revelando. Animais não humanos também possuem mecanismos para lidar com o fracasso e com a vitória e isso também os ajuda a aprender e desenvolver estratégias que funcionam para lidar com o ambiente e conseguir o que querem. Contudo, nós humanos com nosso lóbulo pré-frontal mais desenvolvido, lidamos com o fracasso de uma forma muito mais requintada – para o nosso bem e também para o nosso mal! O que estudamos desde pequenos é que ultrapassar obstáculos e lidar proativamente com o fracasso torna a vitória ainda mais saborosa. Contudo, uma nova pesquisa publicada na revista científica Journal of Experimental Social Psychology questiona essa máxima. O fracasso, na realidade, pode alterar nossa percepção da realidade e nos fazer subestimar o gosto da vitória.

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A vida é cheia de decepções. Como cada um responde a esses obstáculos é essencial para suas decisões e conquistas. Nossas expectativas (quão feliz eu espero me sentir ao conquistar a meta X) possuem um papel chave nesse processo. O problema é que nossas expectativas geralmente são meras ilusões. O psicólogo de Harvard Daniel Gilbert, autor do livro O que nos Faz Felizes, diz que não sabemos o que nos fará felizes no futuro. Nós tentamos adivinhar – e nesse processo criamos expectativas – mas na maioria das vezes nós erramos. Ou seja, muito do que achamos que não vamos gostar nós acabamos gostando e muito do que desejamos ardentemente como se nossa vida dependesse daquilo acaba sendo uma decepção.

Nossas expectativas, na realidade, se tornam os obstáculos. Desejamos coisas que não precisamos e que no final das contas não nos fará felizes, ao passo que deixamos de desejar coisas que podem fazer diferença positiva em nossas vidas. O exemplo mais comum é a saúde. Quem não diz que saúde é o que importa? Clichés não faltam. Você pensaria que tais pessoas valorizam tanto a saúde que a priorizam em seu dia a dia, não? Mas quantos que associam saúde com felicidade, que enaltecem a saúde como “coisa mais importante”, se esbaldam de fast-food, refrigerantes, e frituras, e desperdiçam o tempo livre com sedentarismo? Valorizamos saúde, mas ao mesmo tempo não a desejamos a ponto de tomarmos atitudes diárias para mantê-la. Temos expectativas de sermos saudáveis no futuro, mas não estamos dispostos a pagar o preço para manutenção de um corpo saudável. A falta de saúde, contudo, certamente traz infelicidade. Decerto que deveríamos não só ter saúde como expectativa, mas também como meta e levarmos a sério as atividades que determinamos serem relevantes para esse objetivo. Mas não fazemos isso. Desejamos saúde, mas que ela venha de graça. Por outro lado, mantemos expectativas ilusórias sobre coisas que ou nunca vamos conseguir alcançar (fama?) ou não nos fará felizes. Não que devamos perseguir a felicidade, isso é um buraco negro psicológico. Mas nossas metas devem refletir as necessidades da nossa vida, não nossos desejos narcisistas. A realidade, contudo, é que apesar de conseguirmos teorizar sobre o equilíbrio ideal entre felicidade e metas, nossa psicologia humana geralmente ganha. O que tudo isso tem a ver com fracasso?

A ideia de que o fracasso nos motiva ainda mais e faz a vitória parecer ainda mais saborosa é um mito. Podemos ocasionalmente vivenciar tal efeito, mas na maioria das vezes o fracasso nos desmotiva e nos faz perder interesse na meta. Psicologicamente, essa dinâmica pode ser útil para nos ensinar que talvez a meta não valha a pena mesmo, ou que esteja fora do nosso alcance. Esse mito está tão arraigado no imaginário popular que muitas pessoas lendo isso podem reagir com descrença, afinal de contas o que sempre ouvimos desde cedo é que o ideal é sempre nos levantarmos depois de uma queda. As sagas dos heróis nos livros e filmes estão repletas de narrativas de fracassos repetidos com a culminação de uma vitória impressionante e merecida. A diferença é que a nossa vida não é um filme ou um livro. A história da nossa vida não segue uma narrativa lógica.

O problema todo está em saber separar o joio do trigo: que metas devem ser mantidas mesmo perante fracassos repetidos e que metas devem ser descartadas?

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Há metas que não valem a pena mesmo, só nós não conseguimos enxergar e continuamos como tolos tentando encontrar o Eldorado. Outras metas são difíceis e resultam em obstáculos e fracassos. Persistir em toda e qualquer meta que começamos só porque já investimos recursos nela ou porque desistir é sinal de fraqueza (ou qualquer outro motivo) é tolice. Tomamos decisões erradas o tempo todo, não tomamos? Cometemos todo o tipo de erro de julgamento. Pensamos que uma coisa é de um jeito, descobrimos que é de outro. E isso sem falar em nossas expectativas que geralmente são ilusórias. Isso tudo significa que talvez uma queda, um fracasso, uma decepção possa ser tomada como sinal de que estamos seguindo na trilha errada, estamos procurando ouro de tolo. Esse mecanismo descoberto pela equipe de cientistas mencionada acima provavelmente evoluiu para nos ajudar a efetuar essa tomada de decisão.

Há uma fábula que ilustra bem esse ponto. A fábula de Ésopo chamada A Raposa e As Uvas narra as tentativas de uma raposa de obter uvas de uma parreira carregada de uvas maduras. A raposa tenta repetidamente alcançar as uvas, mas elas estavam muito altas e a subida era muito íngreme. Por mais que tentasse, a raposa não conseguiu obter uma uva sequer. Ela então desiste e vai embora dizendo: “Essas uvas devem estar muito azedas e podem manchar meus dentes. Não gosto de uvas verdes”.

Essa fábula ilustra um fenômeno interessante da cognição humana. Ao fracassar, a raposa inventa um monte de desculpas para justificar que ela não deveria desejar aquelas uvas pois supostamente elas não seriam boas para ela. Ao “fazer a cabeça” sobre as uvas a raposa vai embora e esquece as uvas. Na psique humana, esse efeito pode acabar sendo positivo quando as tentativas de obter algo consomem recursos (tempo, dinheiro, energia, etc.) e não oferecem o retorno desejado. O ideal nesses casos é parar de colocar recursos em coisas que não estão dando resultado ao invés de continuar tentando futilmente. Se a raposa resolvesse que o ideal seria ser mais persistente, ela poderia gastar muita energia e tempo tentando obter uvas que estavam fora do seu alcance, mesmo que as uvas fossem, na realidade, deliciosas. Se a raposa persistisse indefinidamente, ela poderia morrer de fome ou de exaustão. Traduzindo para a vida humana, nossos antepassados se beneficiaram de regras cognitivas como essa, aprendendo que o fracasso às vezes significa que algo está fora de alcance ou não vale a pena.

Essas decisões são difíceis porque há metas que estão ao nosso alcance, mas possuem inúmeros obstáculos. Conseguir distinguir se uma meta é ouro de tolo ou uma maratona exige frieza e calculismo. Nossas expectativas são alimentadas por emoções, em sua maioria, imaturas, narcisistas e ilusórias. Aprofundamos mais sobre esse processo de tomada de decisão no artigo A Arte da Desistência: Como Saber a Hora Certa de Abrir Mão de uma Meta?. Abrir mão de metas que podem ser como as uvas fora do alcance da raposa pode liberar nossos recursos para que possamos nos empenhar em metas bem mais realistas e com chances de dar certo. O efeito psicológico de desmotivação proporcionado pela experiência de fracasso pode ter justamente o papel de nos ajudar a cortar o cordão umbilical e deixar a meta ir embora sem muito drama. Sem esse mecanismo talvez ficássemos obcecados com certas metas por tempo demais, gastando recursos com coisas que já estavam fadadas ao fracasso desde o início ou que não resultariam em grandes benefícios em nossa vida – nem nos traria a satisfação esperada.

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