Se você é mulher e já passou por períodos de “seca”, essa pergunta cretina já deve ter te deixado com raiva algumas vezes!
Mas por que você está solteira?! As pessoas, parentes, amigos, colegas de trabalho, nos olham com aquela cara de perplexidade nos questionando algo que, em primeiro lugar, é super íntimo, em segundo, não é da conta deles e, em terceiro, pode não ser escolha nossa!
As pessoas lançam esse tipo de pergunta como se pudéssemos arranjar um parceiro assim como compramos um sapato novo. Essa pergunta poderia ser lida como “Por que está usando um sapato velho? Por que não compra um sapato novo?” O raciocínio é o mesmo, não?! Nos perguntam por que estamos solteiras, por que não temos um namorado como se fosse mera questão de decisão.
Quem dera fosse assim tão fácil! Fácil, na realidade, é, se formos baixar o nível e pegar qualquer um na rua para nos comer e nos proporcionar a oportunidade de alardear para o mundo que nós temos um namorado. Agora, encontrar uma pessoa que combine conosco, que tenha química, que desperte a nossa atenção e entusiasmo e que em troca sinta o mesmo por nós, minha filha, isso é muito difícil!
E que me desculpem os tios, tias, primos e colegas de trabalho de plantão que tanto se preocupam com a minha “felicidade”, eu prefiro esperar uma pessoa especial aparecer do que dar pra qualquer um. É, eu sei que vocês ficam decepcionados… se eu fosse atrás de vocês eu nunca passaria um dia sem dar na vida, já que, de acordo com vocês, uma mulher adulta jamais deveria ficar solteira…
Eu tenho vontade de mandar tomar naquele lugarzinho quando me lançam essa pergunta idiota! Se for colega de trabalho, eu mando mesmo, mas titio, vovô e priminhas chatinhas… bem, aí eu tenho que fazer o mesmo, só que com diplomacia. Só não consigo esconder a minha perplexidade ao ouvir essa pergunta, que recentemente comecei a ouvir de novo, depois de um casamento fracassado de 5 anos. Jamais pensei que meus familiares começariam a me importunar com esse tipo de pressão menos de um mês após a minha separação. Mas minha indignação maior resultou dos comentários que seguiam o tal questionamento como “uma mulher na sua idade precisa arranjar namorado logo, senão não casa e fica pra titia” ou “ficar solteira não é bom, porque os garanhões caem em cima”. Além de querer sumir, eu tinha que controlar o impulso de meter a mão na cara do interlocutor (que às vezes era um querido tio ou minha amada vovó). Provavelmente não conseguia controlar a ruborização nem as expressões faciais de desaprovação. Mesmo assim, mesmo vendo na minha cara meu desconforto e sofrimento com tal papo, família não tem noção (nenhuma) e continua militando a favor de um novo par para a minha vagina solteira.
Em pleno século XXI, nós mulheres ainda temos que aguentar esse tipo de preconceito. Meu irmão, um mulherengo de carteirinha de 35 anos, nunca namorou por mais de 5 meses, tampouco sofreu qualquer escrutinação ou pressão acerca de sua vida amorosa. Mas ai de mim se citar o caso dele durante uma dessas conversas, “homem é diferente”. Será mesmo?!
Eu já passei por várias fases. Até me casar aos 28 anos, eu ia de “ficante de final de semana” a namoricos rápidos, outros longos, e muitos períodos de seca, em que me sentia feliz da vida. Durante meu casamento, eu passei por momentos em que me sentia satisfeita e realizada por ter encontrado alguém que combinava comigo e outros em que eu sentia saudades da minha antiga vida de solteira, quando eu podia dormir de camiseta velha, andar de roupão pela casa e ficar com o cabelo despenteado e a cara lavada sem ouvir que “aquilo não era sexy”. Esses momentos de saudade foram ficando cada vez mais frequentes, até que um belo dia eu saí de casa para nunca mais voltar.
Dirigindo pela estrada, sem rumo, eu comecei a chorar… de felicidade. Pela primeira vez em muito tempo, eu era dona do meu nariz, podia ir para onde eu quisesse, não precisaria ligar para dar “notícias” ou satisfação, poderia gastar meu dinheiro como bem entendesse e dormir tranquila com a minha camiseta velha preferida. Não, meu ex-marido não me “obrigava” a dormir com alguma roupinha sexy, mas ele fazia questão de comentar o quanto ele “não achava nada atraente eu ficar dormindo de camiseta larga e shorts”, por que (pelo menos) eu não dormia nua? Eu não ligava, nem dormia nua (eu sou friorenta!), mas não conseguia evitar a sensação de que para o meu próprio conforto, eu estava fazendo algo que meu marido não gostava. Se eu passava o dia de cara lavada ele comentava que eu não tinha colocado maquiagem. Era um tipo de pressão passiva, ele (obviamente) não me obrigava a fazer nada, mas fazia questão de me informar que o meu jeito natural de ser não lhe agradava. Ele queria viver eternamente com a garota que ele conheceu num bar e que estava estonteante, maquiada, de salto alto, cabelo feito e tomava cerveja direto da garrafa. Era difícil para ele aceitar que ao se casar com aquela “garota bonita e interessante” ele acabaria a vendo em sua “forma verdadeira” na maior parte do tempo. Não, ele não aceitava isso, ele queria a fantasia para sempre.
Gillian Flynn, autora do aclamado livro (que virou filme indicado ao Oscar) Garota Exemplar, em certo ponto, faz uma análise profunda dessa expectativa masculina. Homens vivem em um universo paralelo. Por serem muito visuais, eles criam fantasias ricas em detalhes e perfeição estética. Dentro desse mundinho vivem as “mulheres perfeitas” (ou “garotas legais” para Flynn), aquelas que são como personagens de contos de fadas, sempre arrumadas, sempre lindas, sempre prontas pra foder. Quando eles se casam com essas mulheres e começam a vê-las como elas realmente são, das duas, uma: ou eles perdem interesse e vão procurar alguma fantasia fora do casamento ou eles começam a fazer pressão em cima da mulher para que permaneçam “pelo menos a maior parte do tempo” como bonequinhas perfeitinhas que eram quando as conheceram.
Nós todas cometemos o “crime” de nos passarmos por “garotas legais” na fase de conquista. Fingimos sermos divertidas, fingimos estar sempre interessadas em sexo, fingimos sermos tão lindas quanto conseguimos nos enfeitar artificialmente com apetrechos e cosméticos. Nós fazemos isto porque sabemos que homens vivem no mundo da lua e procuram fantasias, não mulheres de verdade. Mulheres que insistem em serem “reais” demais acabam sozinhas, tachadas de “feias”, “desinteressantes”, “chatas” e até mesmo um termo que ouvi esses dias: xexelentas!
Esse efeito não é característico da nossa sociedade atual (portanto, não podemos culpar o “mundo de hoje”!), ele é verificado em todas as sociedades, das mais primitivas às mais avançadas. Há comunidades aborígenes na Austrália em que as mulheres colocam aros ao redor do pescoço para alongá-lo e vão adicionando mais arcos ao longo da vida até ponto em que se os arcos foram retirados, o pescoço se quebra e elas morrem. Por que elas colocam os arcos? Para ficarem bonitas para seus homens, é claro! A interseção da biologia com a sociologia humana é realmente muito interessante, mas é assunto para ampliarmos em outro artigo senão eu vou embora nessa tangente!
Assim como em Garota Exemplar, a personagem Amy reconhece que essas expectativas masculinas destruíram seu casamento, na vida real, nós mulheres travamos uma eterna luta para sermos felizes e equilibradas. Ao mesmo tempo em que queremos amar e sermos amadas, queremos compartilhar a vida com alguém que nos entende e nos valoriza, também precisamos jogar o jogo e fingirmos sermos alguém que não somos só para atrair a atenção de um provável cara legal. Se nos recusarmos a jogar o jogo numa tentativa de proteger nossa autoestima e autenticidade, acabamos sozinhas. É uma escolha difícil, mas mais dia, menos dia, todas nós acabamos nos deparando com ela.
É claro que eu reconheço que há homens que caem na real e permanecem fiéis e firmes ao lado de suas “mulheres de verdade”. Mas eu, infelizmente, sou filha de um mulherengo e me casei com um sonhador! Apesar de que, muitos desses aparentemente “homens reais” ficam com a mesma mulher a vida toda porque são covardes (ou simplesmente acomodados), têm medo da vida sem elas, mas no fundo de suas mentes, escondidos dos olhos do “público”, fantasiam com mulheres perfeitas. A biologia é implacável! No final das contas, os únicos relacionamentos com potencial de realmente dar certo (além das aparências) é quando ambas as partes são maduras o suficiente para tirar o foco do relacionamento em si e se preocupar mais em levar uma vida com sentido e dignidade. Quando mantemos o foco no relacionamento, ou seja, na expectativa de que a outra pessoa seja realmente tão perfeita quanto acreditamos que ela é (no começo), ou em como aquela pessoa nos faz felizes, aí sim, é que o fim torna-se uma questão de coragem: quem vai partir primeiro?
A revolucionária escritora francesa do século XIX, George Sand (Amadine Aurore Dupin), que teve casos com o pianista Chopin e o poeta Alfred de Musset, chegou a meia idade decidida a viver sozinha, reconhecendo seu valor como mulher acima do papel social de “servir” a um homem. Ela descreve em sua autobiografia (A história da minha vida) que a partir de uma certa idade, começou a não sentir mais aquela necessidade de se afiliar a um homem para justificar sua própria existência. Isso em meados do século XIX (ela nasceu em 1804) era muito significativo. Sand é considerada por muitos como a primeira feminista (apesar de muitos feministas nem a conhecerem!).
Eu estou dando esta volta porque esses raciocínios estão passando pela minha cabeça agora “pós 30”. Estou começando a me valorizar como pessoa e a me questionar se realmente vale a pena até mesmo procurar outra pessoa. Pra quê? Filhos eu não vou ter mesmo, essa foi uma decisão que eu tomei há muito tempo. Então, o quesito “reprodução” já pode ser riscado dessa lista. Eu sinto necessidade de ter um parceiro pro que der e vier, um companheiro de vida, alguém que irá rir e chorar comigo, que irá e amar e ser amado? Sim, é claro. Mas, por outro lado, eu vejo que muitas pessoas passaram pela vida sem encontrar essa “pessoa especial” e se queimaram muito com pares errados. Eu não sou de ter medo de novas experiências e sou bobinha e sonhadora o suficiente para me envolver com caras errados numa esperança tola de que aquilo dê certo. Mas por outro lado, também acho que ficar se jogando em QUALQUER experiência que se mostre oportuna pode acabar tendo um efeito mais negativo do que positivo.
De qualquer forma, ficar com qualquer um só para amenizar os ânimos familiares (vai ficar pra titia, hein!) é o maior erro de todos. Se escolher muito pode ser perigoso (o tempo passa), se abrir para qualquer um é simplesmente um desrespeito para com você mesma.
Muitas mulheres já com uma “certa” idade, eu diria, depois da fase da faculdade, dos 25 adiante, começam a ter menos oportunidades de encontrar possíveis pares. Quanto menos pessoas você tem contato frequente, menor é a probabilidade de que eventualmente você vai esbarrar em um cara legal que realmente combine com você. Por isso, eu recomendo às minhas queridas leitoras solteiras que curtam a vida solo, mas que mesmo assim, participem de atividades o suficiente para conhecerem gente nova com bastante frequência.
Contudo, se depois de várias tentativas fracassadas, você começar a sentir que não vale a pena destruir a sua autoestima por causa de homens que não te deram valor, saiba que não é crime ficar sozinha. Ignore a pressão, arranje algumas respostinhas bem cretinas pra jogar na cara dos chatos que perguntam “por que você está solteira” e curta sua vida. Viaje, gaste dinheiro, durma como quiser, coma de tudo sem medo de engordar. Viva para você, não para ficar bonita para um homem qualquer. Se aparecer alguém legal, beleza, caso contrário, não se sinta mal por isso. Você vale mais do que o seu potencial de ser namorada/noiva/mulher de um homem.

Helen Peterson é psicóloga e escreve sobre saúde emocional feminina e os problemas que as mulheres enfrentam no mundo moderno.
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